Juiz deve respeitar advogado em sua militância, sob pena de se responsabilizar o Estado por seu desrespeito

Dorval Advogados Associados - Itajaí > Notícias  > Juiz deve respeitar advogado em sua militância, sob pena de se responsabilizar o Estado por seu desrespeito

Juiz deve respeitar advogado em sua militância, sob pena de se responsabilizar o Estado por seu desrespeito

A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região (APELAÇÃO CÍVEL Nº: 2000.71.07.003552-4) condenou a União a pagar uma indenização de R$ 50 mil por danos morais ao advogado de Caxias do Sul – João Batista Bottini Scarpetta – que se sentiu ofendido pela juíza do trabalho da 1ª Junta de Conciliação e Julgamento (atual Vara do Trabalho) do município.  A magistrada, ao proferir a sentença em um processo no qual Scarpetta atuava, criticou a qualidade de seu desempenho profissional, ao examinar a inicial, considerou-a “reveladora de confusas idéias” e ressaltou o “total despreparo” do procurador para o exercício da advocacia. Concluiu ainda que era “uma tortura” manter a leitura atenta das peças do processo assinadas pelo profissional diante de sua “calamitosa desinformação”.

Com a Carta Política de 1.988, o advogado passou a ser reconhecido como indispensável à administração da justiça, sendo que no seu ministério privado, presta serviço público e exerce função social e no processo judicial, contribui, na postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao convencimento do julgador, e seus atos constituem múnus público (CF, art. 133 e respectiva lei regulamentadora, nº 8.906/94), que assim dispõem:

a)- CF, art. 133: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

b)- Lei 8.906/94, Art. 2º: “O advogado é indispensável à administração da justiça. § 1º. No seu ministério privado, o advogado presta serviço público e exerce função social; § 2º. No processo judicial, o advogado contribui, na postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao convencimento do julgador, e seus atos constituem múnus público; § 3º. No exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos e manifestações, nos limites desta Lei”.

Sem sombra de dúvida de que o advogado atualmente encontra-se inserido, ex vi legis, no mesmo plano hierárquico que os demais integrantes do Poder Judiciário, no seu dia-a-dia do foro. Em razão disso, deve procurar relacionar-se de modo cordial e urbano com todos os demais integrantes da atividade forense – juízes, promotores, escrivães, escreventes, oficiais de justiça, etc.

Mas por outro lado, a recíproca é igualmente verdadeira. Todos os demais o devem tratar também com a mesma cordialidade, urbanidade e respeito, sendo sabido que se o juiz faltar ao respeito ao advogado, estará ignorando a igualdade existente entre a beca e toga que obedecem à lei dos líquidos em vasos comunicantes: não se pode baixar o nível de um sem baixar igualmente o nível do outro.

O art. 35 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LC 35 de 1979, LC 35 de 1979, LEI COMPLEMENTAR Nº 35, DE 14 DE MARÇO DE 1979((DOU 14.03.1979), dispõe que são deveres do magistrado: I – cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e atos de ofício.

A função pública de entrega da tutela estatal exige idealismo sincero nos juízes; é o observador que integra a observação, que mede pesa os dois lados da questão, sente as inflexões jurídicas do ato que vai praticar e distribui justiça.

Não pode e não deve tornar o direito tuitivo do trabalhador, que é informal na essência, em formalismo tão cheio de pedras e obstáculos a impedir que o jurisdicionado obtenha a sentença harmonizadora do conflito, ao não lhe permitir o exercício arbitrário das próprias razões, para que não faça justiça com as próprias mãos.

O Juiz deve obedecer apenas ao que lhe dita a sua consciência, mas, na nobre função de instruir e julgar as causas que lhe foram entregues não pode e não deve cercear direito; deve engrandecer, dignificar a Justiça, e não diminuí-la, desacreditá-la.

A Boa-fé deve se fazer presente em todos os atos da vida, sendo que a observância absoluta deste instituto foi revigorado pelo novo Código Civil – exigindo-se de todos o respeito integral ao princípio da boa-fé, que deve estar presente não só entre os contendores, mas incluindo-se também os próprios integrantes do Poder Judiciário, advogados, juízes, promotores, escrivães, escreventes, oficiais de justiça, dentre outros.

O art. 1214 assegura que o possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos, sendo que nos artigos seguintes continua a disciplinar a boa-fé, como princípio exemplar a ser tutelado nas relações contratuais.

Por outro lado, o abuso de poder não encontra guarida no CCB, sendo que comete ato ilícito não só aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito, mas TAMBÉM aquele (até mesmo o juiz) que ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes (artigos 186 e 187 do NCCB).

Sobre essa necessidade de respeito mútuo entre os integrantes do Poder Judiciário ilustrador é o ensinamento do doutrinador pátrio José Rogério Cruz e Tucciin in: “DO RELACIONAMENTO JUIZ – ADVOGADO COMO MOTIVO DE SUSPEIÇÃO, artigo publicado no Jornal Síntese nº 16 – JUN/1998, pág. 3”.

Apesar dessa necessidade de tratamento igualitário e respeitoso de todos os integrantes do Poder Judiciário, certo também que cada qual tem a responsabilidade pelo cumprimento integral de todas as suas responsabilidades, o do juiz o da entrega da prestação jurisdicional, como representante do Estado na pacificação dos conflitos. Portanto, o Juiz deve ser imparcial, eqüidistante dos interesses da contenda, devendo tratar os atos processuais com isenção de ânimo para que possa decidir, visando à necessária paz social.

Mas o advogado também, como ilustra Mário Sérgio Duarte Garcia ao explicar quais são as duas qualidades essenciais do advogado:

“a liberdade e a independência, sendo esta pressuposto daquela. O advogado só está subordinado à sua consciência e não pode deixar de comportar-se com absoluta independência em relação ao cliente e ao juiz, perante quem postula os interesses de seu constituinte”( Autor citado “A ética profissional”, in O Estado de S. Paulo, ed. 30.12.1988, pág. 25).. ”

Com relação ao exercício da função jurisdicional, deve o Juiz obedecer apenas ao que lhe dita a sua consciência, mas, na nobre função de instruir e julgar as causas que lhe foram entregues não pode e não deve cercear direito; deve engrandecer, dignificar a Justiça, e não diminuí-la, desacreditá-la, sendo que a boa-fé deve também se fazer presente em todos os seus atos, como aos demais cidadãos em todos os atos de sua vida.

A necessidade de respeito e observância absoluta desse instituto agora revigorado pelo novo Código Civil, disciplinado pelos artigos 1214 e seguintes, a cuja obediência incluem-se, sem exceção, não só os contendores (partes), mas também os próprios integrantes do Poder Judiciário: juízes, advogados, promotores, escrivães, escreventes, oficiais de justiça, dentre outros.

Todos devem ser tratados com respeito e dignidade, por força do que dispõe a Lex Legum nos artigos , 1º (II, III, IV), 3º (I, II, III, IV), 5º, 7º, 170 e 193).

O dever de indenizar o prejuízo causado ao atingido com o ato é completo, a teor do que dispõe o NCCB, no art.927:

“Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

E em se tratando de funcionário público, a responsabilidade é maior ainda, pela aplicação da responsabilidade objetiva do Estado:

“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo e culpa” (CF, art. 37, § 6º).

Sobre isso a jurisprudência é remansosa, tendo nossos Tribunais, reiteradamente, decidido pela condenação da administração pública por ato então praticado por seus agentes e causadores de lamentáveis eventos danosos a terceiros.

Neste mesmo sentido, decidiu também o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (RS) ao condenar a União Tribunal pelo ato desrespeitoso da Juíza do Trabalho citada por atingir a dignidade do advogado Scarpetta, sendo que o Desembargador Federal Valdemar Capeletti, relator do processo em comento, ao fundamentar a condenação da União, concluiu em seu voto que: “não parece lícito ao juiz manifestar-se sobre os advogados e sua atuação em termos agressivos à dignidade pessoal e, indiretamente, à advocacia e à própria Justiça”, sendo de se esclarecer que o desembargador considerou ainda ser evidente a responsabilidade da União – e não do juiz – pelo fato, uma vez que foi uma agente sua.

 

Fonte: Tribunal Regional Federal 4ª Região

https://fit.oab-sc.org.br/news/edicoes/634.htm#11153

Tags:

No Comments

Leave a Comment

Todos os direitos reservados. Dorval Advogados Associados.